domingo, 27 de julho de 2008

1 - Fazer as malas (III)

Enquanto se dirigia para a porta, pensava:' Não muda mesmo, sempre a quebrar os compromissos!... e se não é ele, quem será... a minha mãe?... mas ela está no Algarve com o marido e a minha irmã!... Ah, às tantas é....'.
Nesse exacto momento abre a porta e dá de caras com D. Rosa, a vizinha do segundo andar. Respirou de alívio e as primeiras palavras que lhe saíram foram:
-Ah, é a D. Rosa...
E antes que a mulher dissesse algo, Maria continuou
-...Desculpe, pensei que era outra pessoa.. .é que estou de saída e pensei que era a minha boleia para o aeroporto!
-Ah, vai viajar, D. Maria... por quanto tempo?
-Para sempre! Respondeu Maria bruscamente, por um lado tentando que a vizinha não fizesse mais perguntas e por outro tentando convencer-se de que jamais voltaria aquela casa!
-E agora vai-me desculpar, D. Rosa, mas é que a minha boleia está atrasada e vou ter de lhe ligar para perguntar o que se passa!
E ao mesmo tempo que dizia estas palavras, empurrava a mulher para a parte de fora do apartamento com uma mão ao mesmo tempo que ia fechando a porta com a outra.
Quando fechou a porta, sentiu-se mal! Nunca tinha sido Assim! Brusca, irónica, mal educada!... e se a mulher estivesse com algum problema e precisasse de ajuda?! Estava a ser egoísta. Não era só ela quem tinha problemas neste mundo!
Não, de uma vez por todas tinha de ir embora e era já!
Pegou no telemóvel, marcou o número do rádio táxi e pediu um táxi para a levar ao aeroporto.

segunda-feira, 21 de julho de 2008

1 - Fazer as malas (II)

A avó Maria das Dores, mulher mais sisuda e menos dada a manifestações de afecto, tinha sido um exemplo de mulher para Maria. A vitalidade com que comandava os trabalhos da grande casa da quinta e a dedicação e respeito que tinha ao seu marido sempre a tinham impressionado. Maria recorda as lágrimas daquela mulher no dia em que o avô Sebastião morreu. Desde esse dia Maria das Dores nunca mais fora vista a chorar.
Outros tempos... pensa Maria ao olhar pela última vez para aquele espaço a que chamou quarto, para aquela casa a que chamou lar durante quase 12 anos. Não era uma mulher como a Maria das Dores que ali estava.
Com lágrimas nos olhos percorre todas as divisões da casa. Recorda momentos bons e momentos muito maus ali passados. Despede-se dolorosamente.
- Se estou livre, porque não me sinto feliz? - pensa.

A pequena mala está pronta. Maria prepara-se para sair dali. Vai para Paris uns tempos, ao menos lá estará longe de tudo e de todos.

A campainha toca. Maria acha estranho, uma vez que combinara com o ex-marido que estaria ali até as cinco e meia e são apenas cinco horas.
Com o coração aos saltos, precipita-se para a porta de entrada.

sábado, 19 de julho de 2008

1- Fazer as malas (I)

Enquanto fazia a mala, sentada na beira da cama, Maria tentava perceber como a sua vida a havia levado até ali!
Incrível como, no espaço de um ano, a sua vida dera uma volta tão grande!
A morte repentina do pai, a dor da mãe, o casamento da mãe, a zanga com a mãe e o fim do seu casamento!
O que ela estava a pôr naquela mala era o que restava de um casamento! Meia dúzia de peças de roupa, alguns livros e muita dor, mas essa não cabia na mala!

Maria tinha tido uma infância feliz, no seio de uma grande família em que 'a união era a força da família', como costumava dizer o seu avô, Sebastião!
O seu avô, Sebastião Vieira de Abrantes... que saudades! Tinha sido militar, alta patente, tinha feito comissões na Índia, Timor... e mais tarde em Angola. Apesar de militar, de austero não tinha nada... quando se juntava com os netos, na quinta em Santarém...